Inspirada numa figura histórica, Hong Gildong é conhecido como um dos Três Grandes Bandidos de Joseon, que os coreanos usam hoje como um nome genérico, correspondente a algo como “João da Silva” em português, em sinal de sua onipresença no imaginário coletivo coreano. Escrita em 1612 durante a dinastia Joseon, narra a trajetória de seu protagonista desde o nascimento, na pele de filho ilegítimo de um nobre e sua concubina. Em uma sucessão de aventuras e façanhas, destacam-se sua inteligência excepcional e dons supernaturais. Com o “destino forjado pelo céu”, Gildong é capaz de prodígios como o domínio das artes mágicas, a capacidade de encurtar distâncias e desdobrar-se e criar réplicas de si mesmo, enquanto que sua força sobre-humana e astúcia são as armas que mobiliza para enfrentar seus antagonistas, sejam eles os poderosos ou os espíritos malignos. Hong Gildong é considerado o “Robin Hood coreano”, já que ele é também um “herói bandido” – que tira dos ricos para dar aos pobres. O livro é tido como a primeira obra ficcional composta em hangeul – escrita de cunho alfabético (letras que representam sons), em contraposição à tradição letrada coreana fundada em ideogramas chineses – pelas mãos de Heo Gyun (1569-1618), um nobre letrado que deixou uma obra não pequena englobando filosofia, poesia, ensaios e ficção, todos redigidos em ideogramas chineses, com exceção desta. E é de se esperar a ressalva de alguns estudiosos hoje por uma “autoria apenas atribuída”, discussão que permanece viva, embora a propriedade do marco zero da literatura coreana em hangeul continue a ser creditada a ele até que tenhamos alguma evidência em contrário. Desde que veio ao mundo, a popularidade da obra não parou de crescer, e conhecemos mais de noventa versões dela, entre cópias manuscritas ou xilogravadas, com ou sem ilustrações, resumidas ou expandidas.A história de Hong Gildong pode ser considerada uma literatura popular coletiva, capaz de espelhar a insatisfação e o afã revolucionário daqueles que estão à margem da elite e que encontram um alento catártico na figura de seu protagonista. A versão trazida ao público brasileiro pela Estação Liberdade se baseia naquela considerada pela academia como a representativa da categoria wanpan-bon (de 36 folhas) — edições xilogravadas impressas em Jeonju na província de Jeolla do Norte. A tradução para o coreano moderno foi feita por Kim Takhwan – crítico literário e romancista, formado mestre e doutor pela Universidade Nacional de Seul e professor do programa de pós-graduação em cultura e tecnologia do Instituto Avançado de Ciência e Tecnologia.
Sobre o autor(a)
Gyun, Heo
Heo Gyun (1569-1618), autor, filósofo confucionista, poeta e político da dinastia Joseon (1392-1897), a última dinastia monárquica coreana. Sua vida política fora atribulada por conviver com grupos considerados subversivos. Acusado de liderar um movimento contra a discriminação de seoja (os filhos ilegítimos da nobreza), foi condenado a mais cruel pena de morte, o desmembramento, aos quarenta e sete anos. |